Produtividade agrícola em declínio
Os canaviais do estado de São Paulo enfrentam uma queda vertiginosa na produtividade devido às queimadas, que atingem patamares alarmantes. A safra atual registra uma redução de quase 10 toneladas por hectare em comparação ao ano passado. A produtividade acumulada até setembro de 2024 caiu para 85 toneladas por hectare, em contraste com as 95 toneladas registradas em 2023. Esse cenário é só o prelúdio do impacto devastador que as queimadas podem ter no setor agrícola brasileiro, um setor que é, em grande parte, a espinha dorsal da economia nacional.
As queimadas resultam em perda de massa e qualidade da cana-de-açúcar, com uma redução drástica na eficiência da colheita. Quanto mais tempo a cana queimada permanece nos campos, maiores são as perdas — o que deveria ser colhido em 72 horas pode se deteriorar quase irreversivelmente após 10 dias. A deterioração da matéria-prima força as usinas a ajustar o mix de produção, aumentando a fabricação de etanol às custas da produção de açúcar.
Efeitos no setor sucroalcooleiro
A queima da cana impacta diretamente a produção de açúcar. Com a elevação dos açúcares redutores, utilizados na produção de etanol, o caldo da cana perde sua pureza, prejudicando a eficiência da extração de açúcar. Além disso, o teor de fibras aumenta devido à evaporação da parte líquida da cana, o que agrava a situação. Com menor quantidade de caldo aproveitável, a produção de açúcar se torna ainda mais difícil.
Essa equação simples — menos açúcar, mais etanol — começa a mexer no preço do açúcar. A commodity já apresenta uma leve alta, com o preço do quilo de ATR (Açúcar Total Recuperável) sendo reajustado para R$ 1,17. Uma economia que depende de variáveis tão instáveis quanto o clima e o fogo só pode conduzir ao aumento de preços e à incerteza no setor produtivo.
Impactos na produção nacional
As queimadas, juntamente com as condições climáticas adversas, geram uma série de consequências para a produção agrícola no Centro-Sul do país. Projeções indicam que a produção de cana-de-açúcar para a safra 2024/2025 deverá cair para 600 milhões de toneladas, uma queda de 8,4% em relação ao ciclo anterior. Esse cenário de retração já afeta tanto o mercado interno quanto o externo, com a produção de açúcar estimada em 38,8 milhões de toneladas e o etanol em 25,3 milhões.
A produção agrícola em todo o Brasil já sofre com a maior seca das últimas décadas, especialmente nas regiões Norte e Centro-Oeste, onde os rios, essenciais para o transporte de mercadorias, estão em níveis críticos. As queimadas não apenas intensificam os prejuízos econômicos, como também elevam os custos de manejo e replantio das culturas atingidas.
Energia elétrica e logística sob pressão
O impacto das queimadas não se limita apenas à agricultura. O sistema elétrico brasileiro está à beira de um colapso com o aumento da demanda por energia em meio às altas temperaturas e secas prolongadas. Estados como Acre e Rondônia já enfrentaram apagões em agosto, e as expectativas são de que a bandeira vermelha na conta de luz, que encarece o consumo, continue em vigor até o final do ano. Isso significa um aumento significativo nos custos de produção para o setor industrial e agrícola, que já sofrem com a logística prejudicada pela baixa navegabilidade dos rios e o aumento no custo do transporte.
Com a seca severa, o transporte fluvial, vital para regiões como a Amazônia, torna-se mais caro e menos eficiente. Isso gera uma cadeia de efeitos negativos no custo de produtos e insumos que precisam chegar aos grandes centros urbanos, como Manaus, onde a logística depende, em grande parte, da fluidez dos rios.
Aumento de preços e inflação
A estiagem e as queimadas atingem diretamente a cadeia produtiva de alimentos, forçando a elevação dos preços. Produtos básicos, como arroz, feijão e frutas, começam a apresentar variações de preços significativas. Esse efeito cascata impacta o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que já foi revisado para uma alta de 4,35% em 2024.
Os consumidores são os primeiros a sentir o impacto das queimadas no bolso, já que a oferta de produtos cai enquanto os custos de produção aumentam. Esse cenário se agrava à medida que as queimadas se alastram, afetando estados produtores como Mato Grosso, que sozinho é responsável por 3,5% dos alimentos consumidos mundialmente.
Reflexos no setor energético
Além da pressão inflacionária nos alimentos, a energia elétrica está em alta. A sobrecarga no consumo, decorrente das altas temperaturas, força o governo a adotar medidas mais severas, como a implementação da tarifa vermelha. Isso penaliza ainda mais a população e as empresas, que já enfrentam um aumento significativo nas despesas.
Os impactos da seca e das queimadas são profundos e estruturais. Eles se manifestam em todos os setores da economia brasileira, desde a produção agrícola até o sistema elétrico. Enquanto o Brasil continua a lidar com a devastação ambiental, a economia paga um preço altíssimo — um preço que, ao que tudo indica, continuará subindo.